03-05-2012
Me enfiei
em um apartamento que pertence a mim, ao meu irmão e à minha tia, e escrevo
encolhido no canto de um dos quartos, sentado em um colchão velho, com a tinta
das paredes pendurada sobre minha cabeça.
Financeiramente
não me parece que isto aqui valha alguma coisa. É um apartamento grande, com,
provavelmente, mais de 50 anos. O encanamento está quase todo destruído (canos
de ferro com cinquenta anos, em Recife, somem, literalmente). A fiação elétrica
é uma lástima (além de um risco à vida dos condôminos) e queima o que quer que
funcione com energia. As janelas de todos os quatro quartos é de madeira.
Podre. Se seguram com suas últimas forças, tentando não cair até a chuva e o
vento do próximo inverno as castigarem, quando então ficarão por conta da sorte.
As paredes estão fofas e manchadas, devido à umidade, fruto do clima, do
encanamento e das dezenas de gatos que aqui viveram em outras épocas. Os
armários embutidos estão estragados, e apesar de não abrigarem cupins, fedem,
rangem e soltam lascas e farpas. Sobraram alguns móveis centenários, escuros e
sombrios, cheios de livros sobre ocultismo, herança de algum ex-morador obscuro.
O corredor, que leva aos quartos, é estreito, e as lâmpadas incandescentes que
o seguem piscam, aleatoriamente, até pararem de funcionar em frente à porta da
suíte, sem luz, da minha avó, falecida há mais de uma década.
Algumas das
histórias que acompanham este apartamento já fizeram com que eu chorasse. Às
vezes de tristeza, às vezes de horror.
Eu não
precisaria estar aqui. Tenho outros lugares onde ficar, em condomínios novos,
com piscinas e elevadores funcionais. Com gente jovem ao invés das entidades
fantasmagórico de gerações que viveram e morreram nestes quartos. No entanto, a
idéia de consertar estas paredes e de jogar fora todo o lixo me fascina por
alguma razão.
Tenho
impressão de que o que me trás até aqui é o mesmo que me levou ao meio do
Cerrado do Piauí, aos moquifos dos centros urbanos da China, às favelas e
regiões de baixo meretrício de São Paulo, às matas e fazendas abandonadas onde
eu acampava quando adolescente, às vilas sem nome de pescadores de um Rio de
Janeiro sem turistas, à cerveja barata e à cama das melhores ilusões que já
tive.
Tenho,
acima de tudo, a impressão de que este lugar torto, casa de tanta tristeza e
desespero, também pode abrigar o nascimento de algo que eu ainda não conhecia.
Algo bom. Para tudo isso, inclusive para mim, tenho esperança.
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